domingo, novembro 30, 2008

A chama imensa: A condição humana e o Benfica.

Por Ricardo Araújo Pereira (in ABola para assinantes)

QUAL é a diferença entre um benfiquista que acaba de sofrer cinco golos e um sportinguista que acaba de sofrer cinco golos? É que o benfiquista não está orgulhoso nem contente. Escuso de dizer que o facto de não termos orgulho nas goleadas que sofremos é, para mim, motivo de orgulho. Gritar «olé!» para celebrar dois passes seguidos de uma equipa que está a levar cinco é não ter noção do ridículo.

Nada disto é novo, evidentemente. Para perceber que os sportinguistas não têm noção do ridículo basta lembrar que se trata de gente que opta por entrar em competições com uma espécie de pijama às riscas. Mas, ainda assim, a atitude do público do Sporting-Barcelona parece ter constituído um novo mínimo.

Quando, por exemplo, os sportinguistas começaram a gritar «Figo! Figo!», quem esperavam estar a ofender? Há um primeiro ponto interessante: que terão pensado os jogadores do Barcelona? «Que aborrecido, pá. É verdade que estamos a dar cinco aos tipos do pijama, mas agora os adeptos começaram a gritar o nome de um jogador com quem nenhum de nós se lembra bem de ter jogado. Bandidos. Sabem mesmo como magoar um grupo de onze milionários que os está a esmagar.»

Mas, se o nome de Figo aborrece alguém, quem é? A equipa que recebeu por ele 60 milhões de euros depois de o ter comprado ao Sporting por um milhão e meio? Quem fica mais melindrado com a homenagem espontânea a Luís Figo? Será boa altura para recordar que se trata do mesmo jogador que, depois de ter abandonado o Barcelona, festejou com particular alegria os golos do Inter contra o clube que o formou? Posso ter esperança de que, numa futura e bastante provável goleada do Benfica ao Sporting, os adeptos leoninos comecem a chamar o nome de Simão Sabrosa para nos maçarem com o facto de ele se ter transferido para o Atlético de Madrid? Queira Deus que sim.

Quanto ao Benfica, vive uma altura de profunda humanidade. Depois da derrota humilhante na Europa, pode alcançar o primeiro lugar do campeonato já amanhã. Tem os pés na lama e, ainda assim, pode conseguir chegar às estrelas. Tudo isto é metafórico, claro. Foleiramente metafórico, mas metafórico. A lama significa a vergonha e a angústia do resultado de Atenas. As estrelas representam o topo da tabela classificativa. Na realidade, tocar numa estrela deve ser ainda mais desagradável do que ter os pés na lama. Mas, no mundo das metáforas, parece que é bom. Amanhã, espero estar a tocar nas estrelas metaforicamente. Vai ser bom, para variar: depois do resultado de Atenas parecia mesmo que tinha engolido uma estrela a sério. Já passaram alguns dias e ainda não me saiu o ardor do estômago.

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