Por Leonor Pinhão (in ABola)
Se Quique ganhar a Jesus, logo muitos benfiquistas torcerão o nariz ao treinador português. Ah, mas se o Sp. Braga ganhar ao Benfica, este Jesus arrisca-se a conseguir convencer os cépticos e até os ateus
O Sporting de Braga-Benfica do próximo domingo é o jogo do ano para o Benfica. Mas de qual ano? — perguntarão, certamente, os leitores mais picuinhas. E é essa mesma a questão que deve ser colocada. Tratando-se de um encontro da penúltima jornada de um campeonato há muito perdido, o deste ano, a que propósito é que a deslocação do Benfica a Braga assume uma importância capital para os benfiquistas a ponto de poder ser considerado o jogo do ano?
Do próximo ano, evidentemente. Convém esclarecer porquê.
Trata-se do treinador. Do próximo treinador.
Um treinador tem muita importância no desempenho de uma equipa de futebol. Há quem defenda que o Benfica precisa de um treinador que se enquadre num projecto longo prazo e que convença os sócios e adeptos de que será necessário dar tempo ao florescimento de uma estrutura vencedora e há quem defenda que um bom treinador para o Benfica seria aquele que ganhasse um campeonato assim que chegasse ao Estádio da Luz.
A solução do treinador para o projecto a longo prazo nunca vingou porque nunca foi experimentada e nunca o será. A solução do treinador que chegasse, visse e vencesse vingou brilhantemente na época de 2004/2005 com Giovanni Trapattoni, cujo único longo prazo que se lhe reconhece é o da sua própria idade e, sobretudo, o da sua imensa sabedoria.
À míngua de vitórias, esta questão do projecto a longo prazo como condição sem a qual não conseguirá triunfar nenhum treinador do Benfica transformou-se num utensílio de argumentação sempre disponível por esta altura da época quando, feitas as contas todas, se verifica que nos últimos 15 anos o Benfica ganhou apenas um campeonato. E graças a um treinador de curto prazo.
Ouvir discutir o Benfica em termos da necessidade de dar tempo a um projecto ganhador a longo prazo é um contra-senso. É coisa de amnésicos. O único projecto ganhador a longo prazo que faz sentido discutir no Benfica é o próprio Benfica, fundado em 1904 — e longo vai o prazo mais do que centenário — com pressupostos tão bem estipulados pelos seus fundadores que o projecto vingou por décadas e décadas, exportou-se como modelo nacional e internacionalmente, dispensando qualquer importação de tecnologia alheia a si mesmo.
Está mal, portanto, o Benfica quando se esquece de si próprio, da sua história, e se oferece às circunstâncias permitindo que lhe discutam a questão do treinador em termos de «tem projecto a longo prazo» ou «não tem projecto a longo prazo».
É por tudo isto que o Sporting de Braga-Benfica do próximo domingo é o jogo do ano para o Benfica. Em antecipação por causa do treinador do próximo ano, assunto que já está em premente discussão.
Frente a frente vão estar Quique Flores, o treinador que aparentemente está de saída, e Jorge Jesus, o treinador português que aparentemente está em primeiro lugar na lista dos possíveis substitutos do infeliz espanhol. Jesus e o Braga estão em alta depois de um campeonato que superou as expectativas e até de uma presença mais do que meritória na Taça UEFA, bem no oposto do que foi o Benfica de Quique Flores na mesma competição europeia e que se resume numa palavra: lastimável.
De acordo com alguns inquéritos de opinião, os sócios e adeptos do Benfica não só não rejeitam o nome de Jorge Jesus como também evidenciam uma confiança expressiva no bom sucesso da sua contratação.
Conheço benfiquistas que assistiram, na segunda-feira, à transmissão televisiva do jogo Belenenses-Sporting de Braga e que, por antecipação, vibraram com a goleada imposta pela equipa de Jesus como se estivessem a ver o Benfica a jogar e a marcar golos atrás de golos.
— Este tipo percebe de bola.
— Vê-se logo que é um treinador que tem a equipa na mão.
— Este tipo até tem muito boa figura.
— Isto sim, é que é futebol de ataque.
— Dá gosto ver jogar o Braga.
— O César Peixoto é muito melhor do que o Aimar.
— Olha-me só o que eles correm.
— Lá vai o Belenenses para a segunda divisão.
— Não vai nada, o último jogo deles é fácil.
— Contra quem é?
— É contra nós, no Estádio da Luz.
— Ah, pois, já não me lembrava.
— Temos um calendário tramado até ao fim do campeonato.
— O Braga a querer o terceiro lugar e o Belenenses a não querer descer...
— Duas grandes complicações!
De um modo geral, é este o estado de espírito dos benfiquistas por muito que custe a acreditar, entre outras coisas, que o célebre e temido inferno da Luz se tenha transformado num inferno para os donos da casa e não para os visitantes como era noutros tempos.
Mas se, quando se trata de futebol, as opiniões são volúveis, quando se trata do Benfica as opiniões são voláteis.
Daí que a fé em Jesus tenha o seu grande teste marcado para o próximo domingo. Se o Benfica de Quique Flores ganhar ao Braga de Jorge Jesus, logo começarão muitos benfiquistas a torcer o nariz, desconfiados sobre as reais capacidades do treinador português. Ah, mas se o Sporting de Braga ganhar ao Benfica, este Jesus arrisca-se a conseguir convencer os cépticos e até os ateus.
E é nisto que estamos.
E é por isto que, sendo o Benfica um clube que gosta de prolongar discussões até que já ninguém se lembre do que se estava a discutir, o resultado mais previsível para domingo seja um empate.
1 comentário:
Continuo na minha, foi mais uma vitória do sistema!!
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