Artigo de Domingos Amaral, no Diário Económico de hoje:
«Sim, Carolina...
Quando José Mourinho regressou ao Porto, já como treinador do Chelsea, levou seguranças, dizendo: “quando vou a Palermo, tem de ser assim”.
Domingos Amaral
Desde Miguel Sousa Tavares aos Gatos Fedorentos, desde Dias Ferreira às revistas popularuchas de televisão como a TV 7 Dias, o ataque a Carolina Salgado foi avassalador. Mal se soube que a senhora tinha escrito um livro onde contava pormenores sobre a vida com Pinto da Costa e revelava alguns dos métodos do presidente do FC Porto para atingir os seus objectivos, o coro de protestos foi imenso. O tom de superioridade moral da maioria foi espantoso: para quase todos, tratava-se de uma senhora reles, sem carácter, duvidosa. Numa palavra, tratava-se de um alvo a abater, e depressa. A tentativa de assassinato de carácter que toda esta gente fez a Carolina Salgado é reveladora, não só dos instintos machistas grosseiros e boçais que ainda prevalecem por cá, como dos instintos de classe. Carolina Salgado não é uma menina bem, não vem de boas famílias, cometeu muitos erros na vida, comeu o pão que o diabo amassou, deixou-se usar numa guerra suja, meteu a mão na anca quando foi preciso e sujou as mãos quando lhe pediram. Sim, é tudo verdade, e também trabalhou como alternadeira, no Calor da Noite. Porém, isso não a diminui aos olhos do mundo, não lhe retira força. Bem pelo contrário. A vontade expressa de a enxovalharem, de a vilependiarem, é apenas uma estratégia, reveladora de um preconceito fortíssimo, um preconceito vil e ignóbil, daqueles que se julgam virtuosos. É tão fácil atirar-lhe pedras, cuspir-lhe na reputação. Tal como muitos chamaram às vítimas do processo Casa Pia prostitutos e mentirosos, agora também chamam a Carolina tudo e mais alguma coisa. É preciso diminuí-la, desgastá-la, descredibilizá-la. A defesa de Pinto da Costa já começou, e os seus lacaios fazem-lhe o servicinho, tendo por isso como aliados os idiotas úteis do costume. É preciso baralhar o povo, confundir as pessoas, para os imorais triunfarem.
Mas, convém ter bem a noção do que se está a passar. Pela primeira vez em vinte e tal anos, houve um terramoto no Porto. Sim, um terramoto de grau muito elevado. As coisas que Carolina revela, e a coragem com que o faz, são terríveis, e mostram que tudo o que se suspeitava pode bem ser verdade.
Aqui há uns anos, quando José Mourinho regressou ao Porto, já como treinador do Chelsea, levou seguranças, e perguntaram-lhe porque o fazia. Ele respondeu: “quando vou a Palermo, tem de ser assim”. Palermo...Palermo é a capital da Sicília, terra da Mafia, da Cosa Nostra. José Mourinho tinha sido treinador do FC Porto, onde tinha vencido uma taça UEFA e uma Liga dos Campeões. Sabia do que falava. Ele vira, por dentro, como funcionava a casa de Pinto da Costa, quais os métodos e as artes. E falava em Palermo...Pena que não tenha sido mais corajoso, contando o que viu. Coragem essa que não falta a Carolina Salgado, fazendo com isso saltar dos eixos o futebol português. Agora, parece ter chegado o tempo de começarmos a saber o que se passa. Agora, esse poder oculto do futebol português vai submergir, vai ser posto a nu, e vai queimar muita gente.
Agressões a vereadores de Gondomar, conversas com árbitros em casa, gavetas cheias de dinheiro, colaborações secretas com a PJ do Porto, controle das classificações do árbitros, suspeitas de associação criminosa. Ao pé das acusações que caiem sobre Pinto da Costa, Vale e Azevedo parece um aprendiz e no entanto foi parar à cadeia. Veremos se a justiça portuguesa considera mais grave uma burla do que uma associação criminosa.
Mas, nos salões bem pensantes de Portugal, nas redacções dos jornais, nos cafés, o que está a dar é achincalhar Carolina Salgado. Chamar-lhe nomes, gozar com ela, é que é giro. Os portugueses são um povo muito curioso, nunca levam a sério o que é sério, preferem a reputação à substância. Por causa dessa característica antropológica, transformam tudo num espectáculo de circo, sem perceber que assim contribuem para perpétuar uma sujeira e não para a limpar. Mas, enquanto há vida, há esperança. Em Palermo, as coisas também mudaram um dia...
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Domingos Amaral, Director da revista “Maxmen”
«Sim, Carolina...
Quando José Mourinho regressou ao Porto, já como treinador do Chelsea, levou seguranças, dizendo: “quando vou a Palermo, tem de ser assim”.
Domingos Amaral
Desde Miguel Sousa Tavares aos Gatos Fedorentos, desde Dias Ferreira às revistas popularuchas de televisão como a TV 7 Dias, o ataque a Carolina Salgado foi avassalador. Mal se soube que a senhora tinha escrito um livro onde contava pormenores sobre a vida com Pinto da Costa e revelava alguns dos métodos do presidente do FC Porto para atingir os seus objectivos, o coro de protestos foi imenso. O tom de superioridade moral da maioria foi espantoso: para quase todos, tratava-se de uma senhora reles, sem carácter, duvidosa. Numa palavra, tratava-se de um alvo a abater, e depressa. A tentativa de assassinato de carácter que toda esta gente fez a Carolina Salgado é reveladora, não só dos instintos machistas grosseiros e boçais que ainda prevalecem por cá, como dos instintos de classe. Carolina Salgado não é uma menina bem, não vem de boas famílias, cometeu muitos erros na vida, comeu o pão que o diabo amassou, deixou-se usar numa guerra suja, meteu a mão na anca quando foi preciso e sujou as mãos quando lhe pediram. Sim, é tudo verdade, e também trabalhou como alternadeira, no Calor da Noite. Porém, isso não a diminui aos olhos do mundo, não lhe retira força. Bem pelo contrário. A vontade expressa de a enxovalharem, de a vilependiarem, é apenas uma estratégia, reveladora de um preconceito fortíssimo, um preconceito vil e ignóbil, daqueles que se julgam virtuosos. É tão fácil atirar-lhe pedras, cuspir-lhe na reputação. Tal como muitos chamaram às vítimas do processo Casa Pia prostitutos e mentirosos, agora também chamam a Carolina tudo e mais alguma coisa. É preciso diminuí-la, desgastá-la, descredibilizá-la. A defesa de Pinto da Costa já começou, e os seus lacaios fazem-lhe o servicinho, tendo por isso como aliados os idiotas úteis do costume. É preciso baralhar o povo, confundir as pessoas, para os imorais triunfarem.
Mas, convém ter bem a noção do que se está a passar. Pela primeira vez em vinte e tal anos, houve um terramoto no Porto. Sim, um terramoto de grau muito elevado. As coisas que Carolina revela, e a coragem com que o faz, são terríveis, e mostram que tudo o que se suspeitava pode bem ser verdade.
Aqui há uns anos, quando José Mourinho regressou ao Porto, já como treinador do Chelsea, levou seguranças, e perguntaram-lhe porque o fazia. Ele respondeu: “quando vou a Palermo, tem de ser assim”. Palermo...Palermo é a capital da Sicília, terra da Mafia, da Cosa Nostra. José Mourinho tinha sido treinador do FC Porto, onde tinha vencido uma taça UEFA e uma Liga dos Campeões. Sabia do que falava. Ele vira, por dentro, como funcionava a casa de Pinto da Costa, quais os métodos e as artes. E falava em Palermo...Pena que não tenha sido mais corajoso, contando o que viu. Coragem essa que não falta a Carolina Salgado, fazendo com isso saltar dos eixos o futebol português. Agora, parece ter chegado o tempo de começarmos a saber o que se passa. Agora, esse poder oculto do futebol português vai submergir, vai ser posto a nu, e vai queimar muita gente.
Agressões a vereadores de Gondomar, conversas com árbitros em casa, gavetas cheias de dinheiro, colaborações secretas com a PJ do Porto, controle das classificações do árbitros, suspeitas de associação criminosa. Ao pé das acusações que caiem sobre Pinto da Costa, Vale e Azevedo parece um aprendiz e no entanto foi parar à cadeia. Veremos se a justiça portuguesa considera mais grave uma burla do que uma associação criminosa.
Mas, nos salões bem pensantes de Portugal, nas redacções dos jornais, nos cafés, o que está a dar é achincalhar Carolina Salgado. Chamar-lhe nomes, gozar com ela, é que é giro. Os portugueses são um povo muito curioso, nunca levam a sério o que é sério, preferem a reputação à substância. Por causa dessa característica antropológica, transformam tudo num espectáculo de circo, sem perceber que assim contribuem para perpétuar uma sujeira e não para a limpar. Mas, enquanto há vida, há esperança. Em Palermo, as coisas também mudaram um dia...
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Domingos Amaral, Director da revista “Maxmen”
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