domingo, dezembro 16, 2007

Ser comido por um pastel

Por ricardo araújo pereira

"Não sei se o leitor já percebeu mas, na verdade, quem escreve esta crónica não sou eu, são os jogadores do Benfica: quando ganham, isto sai relativamente razoável; quando perdem, não se aproveita nada. Tendo em conta o resultado de ontem, se quiser parar de ler e ir já forrar o caixote do lixo com esta página, eu compreendo. Mas fica sem saber o seguinte: aquilo que aconteceu não foi bem uma derrota. Foi Natal. Reparem: o jogo era em Belém, contra uma equipa que tem a cruz de Cristo ao peito e um Jesus no banco. Ganhar, em plena época natalícia, seria um escândalo. Mais do que os três pontos, teríamos ganho um lugar no Inferno. Era certinho. Assim, não posso concordar com o Petit quando diz que a exibição do Benfica foi péssima. O Benfica fez uma exibição de reis. Não esquecer que são os Reis Magos quem oferece os presentes a Jesus. Foi o que nós fizemos.

Confesso que me custa ser o único a ver a realidade como ela é. Sinto-me um pouco sozinho. A maneira de encarar a derrota de ontem é só um exemplo. Dou outro: sempre que o Rui Costa falha um passe ou perde uma bola em corrida há sempre um reaccionário que lembra a idade do homem. O problema não é esse. O que acontece é que o Rui Costa, de vez em quando, acusa o peso da camisola. Ele começou na Fiorentina, passou pelo Milan e, finalmente, chegou ao Benfica. Tem sido uma carreira sempre a subir, e é evidente que a responsabilidade aumenta. Jogar descontraído em Milão é fácil. Com a camisola de um clube de dimensão mundial, torna-se mais complicado. Compreendam isso e larguem o rapaz.

Depois do jogo contra o Dínamo de Kiev, Miguel Veloso e João Moutinho foram oferecer as camisolas à Juve Leo. A Juve Leo pegou nas camisolas e atirou-as de volta para os jogadores. Mesmo sendo benfiquista, esta atitude deixa-me chocado. Ou, melhor dizendo, sobretudo sendo benfiquista. É que eu também considero que uma camisola do Sporting é um péssimo presente, e também me recusaria a receber uma. O choque é precisamente esse: eu fico extremamente repugnado por ter qualquer coisa em comum com a Juve Leo. À partida, não podíamos ser mais diferentes: eles são do Sporting e eu não; eu sei comer com talheres e eles não. Mas, pelos vistos, no que toca a receber camisolas do Sporting, somos almas gémeas.

Minto. Eles atiraram a camisola para o chão. Eu teria recusado de forma mais respeitosa. Talvez a oferecesse ao meu amigo Zé Diogo. E nunca atiraria a camisola do Miguel Veloso para o chão. Deve cheirar a Chanel nº 5, e eu teria pena de arremessar um objecto tão delicado ao chão. Pouca gente sabe disto, mas as camisolas dos jogadores do Sporting são todas da marca Puma, menos a do Miguel Veloso, que é Christian Dior."

In ABola

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