domingo, setembro 14, 2008

A chama imensa. A moralidade duvidosa das vitórias morais


Por Ricardo Araújo Pereira in Abola (para assinantes)

Como se costuma dizer, Nápoles apadrinha a estreia do Benfica na Taça UEFA de 2008/2009. Eu não aprecio repetir o que se costuma dizer, mas desta vez é particularmente apropriado. Nápoles apadrinha, e com toda a autoridade, porque lá de padrinhos percebem eles. Essa é, aliás, a minha principal preocupação para o jogo desta semana: o Benfica vai jogar à capital da Camorra com o Nápoles, e receio que possa ter dificuldades em adaptar-se. Não estamos nada habituados a defrontar mafiosos vestidos de azul e branco. Enfim, há sempre uma primeira vez para tudo, mas tenho medo que os nossos jogadores estranhem a situação, que é completamente nova.

Em Itália, aliás, é tudo diferente. Basta reparar em Ricardo Quaresma, também ele com sérias dificuldades de adaptação. Foi titular no jogo de ontem, contra o Catania, mas via-se a surpresa estampada no rosto do rapaz. Estava com uma expressão que dizia: «Então mas os adeptos da equipa em que eu jogo não me assobiam? Este futebol italiano é difícil de compreender.»

E é mesmo. Em Itália, imagine o leitor, as equipas que são condenadas por corrupção descem mesmo de divisão. Não há-de o Quaresma andar à nora.

É sempre lamentável quando alguém cai no flagelo da imparcialidade. Da equidistância em relação a tudo, da isenção, da neutralidade. Não poder manifestar uma preferência, uma paixão, ou passar a vida a fingir que se é imune a elas deve ser uma tarefa difícil e amarga. Quando sucede o contrário, celebro. Por isso, esta semana tenho de dar os parabéns a Rui Santos. Para mim, Rui Santos estava perdido para sempre. Era um pertinaz crítico da clubite, quando a clubite é das melhores coisas que uma pessoa leva desta vida. Ninguém pode dizer que viveu enquanto não defender um argumento totalmente indefensável por causa do amor irracional que sente por alguém ou alguma coisa. Foi o que fez Rui Santos, esta semana. Rui Santos pode não ser benfiquista, sportinguista, ou portista, mas também tem clube: é carlosqueirosista. Depois da derrota da selecção frente à Dinamarca, Rui Santos escreveu: «na inevitável comparação com o passado recente, a Selecção de Queirós deu aos portugueses um pouco mais de quase todas as variáveis que entram nas contas de um desafio (velocidade, ritmo ofensivo, sedução pelo futebol colectivo (…); só ficou a perder para a Nossa Senhora do Caravaggio!» Na verdade, também perdemos para o adversário, e em casa — coisa que, com Scolari, nunca aconteceu: o brasileiro não perdeu qualquer jogo de apuramento disputado em Portugal. Mas, como bom carlosqueirosista, Rui Santos encontra saldo positivo na selecção de Queirós. É certo que a de Scolari ganhava, mas tinha menos velocidade. Agora perdemos, mas damos um baile em ritmo ofensivo. Os dinamarqueses vão para casa com os três pontos, mas também levam a certeza de que foram humilhados em sedução pelo futebol colectivo. Se aquilo que se vai organizar na África do Sul daqui a dois anos fosse um Campeonato do Mundo de Velocidade, Ritmo Ofensivo e Sedução Pelo Futebol Ofensivo, a selecção de Queirós ganhava de certeza. As velhas vitórias morais acabaram de ganhar um nome mais sofisticado.

Mais um a malhar na osga Rui Santos.

2 comentários:

Anónimo disse...

RAP no seu melhor, é incrível a argucia deste rapaz. Ainda bem que está do nosso lado, é espectacular o modo como desmonta e remata tudo o que tenha a ver com os corruptos e paineleiros avençados.

Bravo RAP,não pares nunca.

Ian10 disse...

http://fanasdabola.blogspot.com/